Minha mãe sempre disse que eu era uma copiadora.
Bem... Talvez eu seja um pouco.
Quando se é uma criança, quem é o seu maior exemplo? Geralmente, e no meu caso também, é mãe... Certo? Você quer ser como ela, aquela mulher forte que te ama desde o ventre e mostra uma perfeição em tudo que faz que chega a ser assombrosa. Dizem as más línguas que mães são de outro mundo e têm poderes, afinal, aquela blusa que você não encontra em lugar nenhum está lá na gaveta, assim que ela se abre e fala “essa blusa filha?”. Você pode ser o cego da história, pode não ter prestado atenção... mas pode jurar que a tal blusa não estava lá! Como ela faz isso??
Minha mãe é jovem. Bastante! E somos parecidas. Até demais! Quando eu era pequena e olhava para cima... via uma mulher tão linda! Os sorrisos sempre dispostos a me receber, o olhar firme que deixava claro o que era errado fazer e podia até congelar a espinha! O toque doce e suave nos cabelos... aquele toque gentil no nariz que tinha o poder de me fazer dormir em segundos... aquela pessoa mágica que sempre esteve ali. Eu era um bebê ainda, mas sabia quando ela entrava no quarto e a reconhecia sem ao menos olhá-la. Nada mais normal que querer ser como ela!
Mamãe começou a tocar teclado? Também quero! Mamãe adorava escrever e ouvir música... olhe só para mim! As palavras no papel (ou na telinha) são mágicas em minha vida, música é a grande companheira. Certa vez mamãe começou a pintar tecido e tela à óleo... como uma boa copiadora, também o fiz! Mamãe é chata com gramática... bebê aprendeu a ler desde cedo. Mamãe é expert em quase tudo que faz... bebê está tentando.
Seus traços... os trejeitos... o tom da voz... Céus! Bebê copiou tudo! Como pode?
Mas por mais que eu copie essa mulher, ela sempre consegue superar todas as expectativas e aparecer com alguma coisa que o bebê ainda não sabe... e, claro, lá vamos nós copiar!
Podem me chamar de plagiadora, copiadora e até sombra... e é verdade! A mãe é a primeira referência feminina que temos na vida, pode ser de sangue ou não, ela está lá! Pronta para te pegar quando cair ou quando ficar cansada demais para andar, seus pezinhos balançando em seu colo, os olhinhos cansados...
Mas nós aprontamos cada uma! Eu fui uma criança dócil – é sério! Não faz essa careta não –, mas também muito travessa! Do tipo curiosa que desmonta TODOS os brinquedos para saber como funciona lá dentro. Certa vez, mamãe, eu e a babá fomos às compras. Obaa! Criança adora correr hein? Enquanto ela escolhia as roupas, a babá ficou encarregada de cuidar de mim... Afinal, o que uma menina de seis aninhos poderia fazer?
Simples. Se esconder debaixo de uma arara de roupas sem ninguém ver porque estava cansada de ficar em pé. Na minha cabeça era algo tão normal... não tinha problema! Mas eu não sabia que mamãe ficaria tão preocupada e desesperada! Ela correu pela loja inteira, mandou a babá para a porta e começou a me procurar... Quanto a mim? Bem... eu fiquei sentadinha lá, tampando a boca com as mãozinhas pequenas e rindo! Não demorou para que me encontrassem, a frase “a gente conversa mais tarde” nunca foi tão real.
Mães precisam de tanta paciência! Certa vez decidi que seria artista. E todo artista precisa de material... tipo a sandália de plástico ou a bolsa de couro da mamãe. E uma criança com uma caneta nas mãos faz muitas artes! Eu lembro de um abajur com cristais... e em como aqueles cristais ficaram lindos espalhados pelo chão.
Fui a criança mais quieta do mundo quando visitava pessoas... mas adorava a casa da nona! Era o lugar em que as gavetas não ficavam muito tempo abertas. Gostava de falar com as flores também, e acreditava que nas raízes das plantinhas vivia um príncipe amaldiçoado! Cabeça de criança é uma coisa linda, não?
Eu amava quando minha mãe me colocava em seu colo, segurava meus bracinhos e me balançava para frente e para trás. Serra, serra, serrador. E era tão divertido! Gargalhava como ninguém e morria de medo de quando ela tirava as pernas e eu “caía no precipício”, mas segundos depois lá estava eu pedindo mais.
Minha mãe também era – é até hoje – a médica da casa. Foi tirar sangue e está com curativo no braço? Ahhh, é só uma olhadinha... e PUFF! Em um puxão o curativo desaparece e as lágrimas surgem. Lembro que uma vez fui tirar sangue – que exame horrível! – e estava com tanto medo que ninguém conseguia me segurar, porque consigo ser arisca quando quero. Então lá veio a mamãe... e me prendeu de tal forma que fiquei realmente imobilizada! Foi um dia triste... odeio agulhas.
Como disse, era a desbravadora de mares curiosa que mexia em tudo... por isso tivemos algumas baixas em casa, como o espelho da cama ou a estátua que eu esbarrei “acidentalmente”.
O quê? Foi um acidente! Tive vários acidentes, na verdade...
Mãe é aquela criatura estranha que consegue te deixar sem argumento, te faz arrumar a cama todas as manhãs e te olha feio quando tenta fazer uma travessura. Mas quando precisa, ela é aquela que estará lá por você. Certa vez fui parar no hospital... outra semana triste, pra quê existe agulha? Enfim, eu fiquei alguns dias por lá... e ela ficou comigo. Todos os dias. Todas as noites. Estendeu o cobertor quando fiquei com frio e segurou meu braço para que a intravenosa não escapasse e eu tivesse que levar agulhada de novo – se eu me mexia muito à noite? Claro que não. Ela ficou lá quando pedi uma revistinha de pintar do Sítio do Pica Pau Amarelo, quando tomei o suco de laranja que não era nada legal e quando me acabei de comer o frango, que era maravilhoso!
Minha mãe sempre adorou fotos... fotos todos os dias! Fotos da Sté com vestido azul e flores no cabelo, cliques da Té com um conjunto marrom que me deixou estilosa e capturas de uma menina que tinha vergonha de entrar como daminha no casamento com o vestido branco, em cima da pia.
Quase toda criança usa chupeta e mamadeira... eu não. Minha mãe dizia que estragava os dentes e viciava a criança, então ela me acostumou desde sempre a usar o copo. Se visse as fotos de criança, lá está um pingo de gente com um copinho nas mãos. Mamãe também sempre ensinou a escovar os dentes, ela colocava algo macio no dedo e passava no meu sorriso sem dentes com toda a calma do mundo! Ela me vestia como uma boneca, de meia de cetim, sapatos de verniz, vestido delicado e um enfeite no cabelo.
São muitos os momentos em que a minha mãe e eu tivemos juntas... não tem como escolher! Esses foram apenas alguns dos que eu lembro. Poucas lembranças de uma infância cheia de mães. Já disse que sou parecida com a mamãe, certo? Bem... e se eu dissesse que ninguém acredita que somos mãe e filha? Para todos os efeitos, irmãs. Tirando a parte ruim de ser comparada à irmã de sua mãe, é bom saber que você é como ela... seu sonho de infância de ser como a mamãe está se realizando!
Mas isso não é de todo bom... por sermos parecidas, temos os mesmos jeitos, o gênio idêntico e a teimosia também! As duas não gostam de degradê em artes gráficas – meus amigos já começam o bullying aqui – e ambas amam escrever! Não tem como existir uma discussão, porque as duas sabem o que a outra vai dizer e antecipam. O jeito de mexer as mãos, o tom de voz para se expressar...
o cabelo.
Os olhos.
Os traços do rosto!
Sou uma exímia copiadora. Tudo que minha mãe fizer... ahhh, você já sabe né?