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  • Stéfane Franco

Nas asas de uma Borboleta Vermelha

Aquele tinha tudo para ser um bom dia... e eu estava tão ansiosa! As próximas horas seriam o primeiro passo para uma mudança sem precedentes em minha vida, algo que esperei por anos e não via a hora de realizar.

Pra isso, peguei o metrô e, por uma precaução, cheguei ao lugar que precisava realmente muito cedo, e quando digo cedo... é uma hora antes. Então sentei nos bancos da estação, peguei um livro da minha bolsa e adiantei a leitura até faltar cinco minutos para o tal compromisso.

Okay, respira fundo... e vamos lá. Rumo ao futuro. Aquele dia seria um divisor de águas... e eu estava incrivelmente tranquila.

Quando finalmente cheguei, peguei minha senha e, do nada, toda a calma que mantive durante a semana acabou em segundos, fiquei nervosa e ainda mais ansiosa! Pelo que me haviam dito, seria algo fácil, só entregar alguns documentos, uma justificativa e pronto, tudo seria encaminhado... mas quando fui atendida por uma moça de pouco mais que vinte e cinco anos... caí de uma escada de mil andares sem ter a chance de me segurar num corrimão.

Era como se tudo pelo que eu mais queria fosse uma grande utopia, algo irrealizável... e loucura da minha parte. Segundo ela, eu não tinha justificativa válida e, nas entrelinhas, estava cuidando para que eu não me arrependesse futuramente e minha consciência ficasse limpa.

Mas como ela poderia saber?

Foi nesse momento que percebi o quão é injusto o mundo. Digo... é claro que eu sabia uma coisa ou outra sobre isso, mas ver seu grande sonho desmoronar à sua frente e não poder fazer nada é totalmente angustiante, você perde o chão e não sabe para onde ir ou o que fazer... você apenas coloca sua bolsa nas costas e volta com os ombros baixos e o coração apertado.

Era cedo ainda, então não pensei duas vezes em ir para o trabalho... mas isso não significou que eu estava bem. Ahhh não, muito pelo contrário! Estava destruída por dentro e deixei que a rotina me levasse pelo caminho certo, torcendo para que minha falta de atenção ao redor não me causasse nada.

Os olhos formigavam como se aquela angustia estivesse batendo na porta do meu emocional e dizendo “ei, eu quero sair daqui... me ajuda!”.

Mas eu não queria chorar! Na verdade, odeio chorar em público... e segurei o máximo que pude. Mas olhando pela janela do ônibus, enquanto as majestosas árvores da praça se afastavam, meu coração ficava mais apertado e, no fim, foi inevitável quando algumas lágrimas caíram, sem ao menos pedir licença.

O pedido de ajuda que gritava em meu peito parecia gritar por liberdade... Não era justo um fantasma do passado atrapalhar minha vida daquele jeito, muito menos pelo fato de estar tão longe... e ainda assim interferir. As palavras que me derrubaram mais cedo, vindas da boca de uma mulher completamente estranha, ainda rondavam minha mente. “Você não vai conseguir”, ela disse.

“É improvável”.

Mas não deveria ser eu a tomar as decisões sobre a minha vida? Não seria eu que carregaria as consequências pelo resto da vida? Da mesma forma, por que tinha que ser uma pessoa totalmente desconhecida e ignorante da verdade a decidir o que aconteceria?

Ninguém se sentou no assento ao meu lado. Assim que cheguei ao trabalho, mandei uma mensagem para algumas pessoas... precisava jogar aquela angústia para os ares e uma conversa virtual resolveria por um momento. Mas enquanto todos os outros riam e resolviam problemas corriqueiros, me isolei em meus fones de ouvido e uma playlist animada. Queria empurrar o desconforto e as lembranças para o fundo de meu inconsciente a todo custo, presava sair daquilo!

Tentei não pensar no assunto e, entre camadas e vetores do Illustrator, consegui afastar a dor para longe e terminar meu serviço... mas dizem que ela não acaba até você coloca-la para fora, certo? Se não ela fica te cutucando de dentro para fora até que você perca a cabeça... E então uma amiga me tirou da sala e fomos conversar.

Novamente, eu me recusava a chorar. Mas enquanto eu contava tudo que aconteceu, as mesmas palavras que me perseguiram por todo o caminho voltaram. “Você não vai conseguir”. Aquela dor que me cutucou a manhã toda ficou mais forte.

“É improvável”.

Então finalmente desabei, não tinha como segurar! Eu tentei, juro que tentei falar sem tremer e ignorar o quanto minhas mãos estavam fracas... Mas, pensando agora, eu precisava daquilo... se não soltasse tudo iria piorar, meu dia seria estragado e nada valeria a pena até deitar minha cabeça no travesseiro e chorar, sozinha, no escuro da noite. Assim que fui abraçada, me permiti fechar os olhos e derramar as lágrimas que segurei por horas... a pressão que apertava meu coração foi acentuada, é claro, mas logo em seguida se acalmou.

Soltar o que te aflige realmente funciona, é como se um peso fosse tirado de suas costas. A dor continua alí, mas a intensidade é muito menor e suas asas se abrem. Está livre!

“Você fica fofinha quando chora, toda vermelha”, e a risada foi inevitável. Quando estamos no fundo do poço emocional, um riso solto tem a capacidade de erguer uma escada até a borda do poço, e um abraço te estende a mão e te dá forças para sair daquele lugar.

Sem saber, todos os meus amigos, que convivo diariamente, me fizeram rir mais que o costume o dia todo, me fizeram esquecer completamente do quão ruim foi minha manhã e colocaram um curativo no machucado que havia se aberto em meu peito. Passei um dia feliz, ri à toa de piadas sem sentido, me diverti com tropeções e conversas aleatórias... e foi realmente ótimo!

Na volta para casa, todo o peso que sentia já havia desaparecido, minhas asas estavam bem abertas e a esperança pulsava forte em minhas veias. E mesmo quando, no ônibus, outra amiga me deu uma bela pisadela no pé, senti que poderia fazer qualquer coisa.

E foi então que algo inesperado aconteceu.

Um japonês desconhecido, de uns quarenta ou cinquenta anos, aproximou-se e estendeu a mão. Eu já estava esperando mais uma das ridículas cantadas de ônibus quando ele me entregou uma borboleta vermelha de origami. Eu não esperava por aquilo, mas um sorriso involuntário se abriu no meu rosto e o coração se aqueceu...

Sabe aqueles momentos sem sentido, que acontecem sem explicação alguma e te deixam confusa? Aquele gesto simples, extremamente pequeno e, talvez, sem importância na correria do cotidiano, deixou meu dia, que começou horrivelmente ruim, bem melhor. Depois de entregar um pássaro para a amiga da pisadela, recebi um segundo presente: dois botões de flores de origami.

Sim, tudo aquilo que dizem sobre os pequenos gestos importarem é verdade. Eu estava destruída quando entrei no ônibus de manhã e encarei a paisagem se mover, mas com cada simples atitude de pessoas que não faziam ideia do que estava acontecendo, o sol se abriu para o prisioneiro do poço. Um abraço arrancou as lágrimas que eu segurei com tanto afinco e remendou a rachadura que se abriu, frases divertidas e piadas sem graça arrancaram risos soltos da minha garganta e, no fim, uma borboleta vermelha conseguiu o que talvez foi um dos mais puros e verdadeiros sorrisos daquele dia.

Agora, isso me fez pensar... não sei se acredito em destino ou forças sobrenaturais, isso já é história para outro texto, mas sei que, ás vezes, quando estamos com o emocional lá em baixo, aparecem aquelas pessoas que transformam uma tempestade em um arco-íris... ou, talvez, com a correria do dia a dia, não notamos os pequenos gestos que fazem a diferença, e que aparecem apenas quando mais precisamos. Você já pensou em como pequenas coisas podem mudar o mundo de uma pessoa?

Naquele dia eu precisava de um forte abraço e, mais que nunca, de esperança...

e o mundo, mais do que depressa, se encarregou de os trazer nas asas de uma borboleta vermelha.




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